QUANDO É OBRIGATÓRIA A PRESENÇA DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA?

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mar
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A EXIGÊNCIA LEGAL DA PRESENÇA DO PROFISSIONAL DA EDUCAÇÃO FÍSICA NAS ATIVIDADES DESPORTIVAS ORIENTADAS: CONSIDERAÇÕES JURIDICAS

 

A Constituição de 88 em seu art. 217 declara expressamente ser “dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um”.

Uma leitura leiga ou apressada do seu texto levaria comumente à compreensão de que o dever de fomento do poder público significa a simples tarefa cometida ao Estado de dedicar recursos públicos ao esporte, seja diretamente com doação de recursos, seja indiretamente através de incentivos fiscais, ou ainda de promover a atividade desportiva por intermédio de seus órgãos e corpo funcional.

Ocorre que essa missão conferida pelo Texto Maior ao Estado não se restringe a esses aspectos, pois o dever constitucional de fomentar o esporte abrange também e principalmente o encargo de zelar com que a atividade desportiva se desenvolva de maneira correta e regular.

De fato, conforme anota Prieto, por fomento “há de considerar-se a ação dos poderes públicos tendente a proteger, promover e impulsionar o fenômeno desportivo, ao entender-se que constitui um dos elementos básicos que integram o conceito de qualidade de vida cidadã […]”[1].

Seguindo-se essa linha de raciocínio, sublinha-se que uma das formas a serem adotadas pelo Estado na proteção da atividade desportiva é a de velar para que também seja observado o XIII do art. 5º da CF, o qual, conquanto preveja que seja livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, exige que sejam atendidas as qualificações profissionais que a lei venha a estabelecer.

Nesse sentido, reza o art. 1o da Lei 9696/98 que o exercício das atividades de Educação Física e a designação de Profissional de Educação Física é prerrogativa dos profissionais regularmente registrados nos Conselhos Regionais de Educação Física.

Portanto e dada a amplitude das competências atribuídas aos Profissionais de Educação Física conferida pelo art. 3º da referida lei, tem-se por absolutamente imprescindível a sua presença em todos os projetos desportivos que sejam implementados em nosso país.

Aliás, não se perca de mira que a Lei 9615/98 estabeleceu como um dos princípios do desporto o princípio da qualidade, “assegurado pela valorização dos resultados desportivos, educativos e dos relacionados à cidadania e ao desenvolvimento físico e moral” (art. 2º, inciso IX).

Relacionando o dispositivo ao tema em apreço, é bem de ver que não se pode ter qualidade em qualquer atividade físico-desportiva sem a correspondente orientação do profissional de educação física.

Diante da imperiosidade legal da presença do profissional de educação física na implementação e realização dessas atividades, tem-se, a partir dessa premissa, importante conseqüência prática, já que se impõe ao poder público exigir o cumprimento desse pressuposto ao fiscalizar o seu exercício.

Assim, a exemplo do que ocorre numa obra de engenharia, que deverá possuir um engenheiro encarregado pela sua realização ou na prestação de serviços laboratoriais, o qual carece da indicação do médico responsável, ou ainda na materialização de um projeto arquitetônico que exige a declinação do nome do arquiteto que chancela a sua confecção, há que se exigir o mesmo na realização das atividades físico-desportivas, as quais deverão ter um profissional de educação física que responda pelo serviço a ser executado.

Em outras palavras, tem-se que, sem embargo de outras, não poderão ser autorizadas pelo Estado a realização das seguintes atividades que não contem com um profissional de educação física respondendo pela sua execução:

– Projetos desportivos que objetivem a obtenção de algum beneficio fiscal do Estado;

– A participação de equipes desportivas em competições regulares;

– Atividades institucionalizadas voltadas para o lazer, como programas de atividades físicas voltadas a terceira idade, gestantes ou escolinhas de esportes destinadas a orientação de menores, como futebol, judô, natação, dentre outras;

– Serviços turísticos envolvendo o oferecimento de esportes radicais, como bungee jump, rafting, escalada e etc;

– Atividades desenvolvidas com a finalidade de aprimorar a condição física dos interessados, como musculação, hidroginástica, ginástica aeróbica dentre outros;

É de se notar, inclusive, que o ordenamento jurídico brasileiro demonstra, em todas as oportunidades possíveis, que procura sempre condicionar a concessão de qualquer benesse ou vantagem às entidades desportivas que contem com profissionais de educação física em seus quadros.

Veja-se, por exemplo, a Lei nº 9615/98, que exige que as agremiações possuam em seus quadros profissionais especializados em formação técnico-desportiva, para que possam fazer jus ao ressarcimento pela formação de atletas de futebol.(art.29 §7º).

Outra conseqüência jurídica importante decorrente da imperiosidade da presença do profissional de educação física, é que a não observância dessa exigência deverá acarretar, para a entidade responsável, numa presunção de culpa nos casos em que os praticantes venham a sofrer danos decorrentes do exercício dessas atividades, mormente naquelas que lidem com o ensino e a aprendizagem na prática do esporte.

Conforme assinala Spiegelberg, uma das circunstâncias a ponderar na hora de se valorar a procedência de uma pretensão de ressarcimento do dano sofrido por motivo ou ocasião do ensino do esporte, “se encontra, em primeiro plano, na qualificação profissional de quem assume a tutela de dita aprendizagem, e, por conseguinte, a necessidade de que conte com os conhecimentos necessários para ela.”[2]

Ora, se não houver profissional habilitado para tanto, há que se presumir a responsabilidade de quem implementa a atividade sem a orientação de profissional habilitado, fazendo surgir assim, o seu dever de indenizar os praticantes que experimentem danos à sua integridade física na execução, já que se deve partir do pressuposto de que foram mal orientados a realizar os trabalhos físicos e desportivos a que tenham sido submetidos.

Dessa forma, a imperiosidade da presença do profissional de educação física atende a outro princípio fundamental da prática desportiva descrito pela Lei nº 9.615/98, que vem a ser o princípio da segurança, a ser “propiciado ao praticante de qualquer modalidade desportiva, quanto a sua integridade física, mental ou sensorial” (art. 2º, inciso XI).

CONCLUSÂO

Diante dessas singelas considerações expendidas, pode-se concluir que a presença do profissional de educação física nas atividades físicas e desportivas decorre de exigência não apenas legal, mas deflui também de mandamento constitucional.

Ademais, é mister assinalar que se inclui no dever constitucional do Estado de fomentar o desporto a tarefa de velar com que essa imposição normativa seja observada.

Por outro lado, referida exigência atende também a dois princípios fundamentais da prática desportiva em nosso país, quais sejam o da qualidade e da segurança na sua execução, sendo que a não observância desse requisito deverá desaguar na presunção de culpa do responsável, acarretando para este o dever de indenizar os particulares que sofram danos decorrentes da realização das atividades que não sejam orientadas por profissional habilitado pelos Conselhos de Educação física.

[1] PRIETO, Cazorla. Derecho Del Desporte. Tecnos: Espanha, 1992. (tradução livre) (grifou-se).

[2] SPIEGELBERG, José Luiz Seoane. Responsabilidad Civil en el Deporte In: SÁNCHEZ, José Ignácio Alvarez. (org). Responsabilidad Civil Professional. Madrid: Consejo General del Poder Judicial. Cuadernos de Derecho Judicial. T. VII, 2003, p. 513. (tradução livre) (grifou-se).

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